O mês de mil dias no multiverso
Este texto era para ser outro, que eu queria ter publicado no último dia 22 de maio, quando completei um mês no meu novo trabalho. Era para ser um texto sobre o quanto aprendemos quando deparamos com o novo, mesmo com três décadas de experiência profissional nas costas. Também era para falar sobre como a maturidade nos ajuda a modular a energia que dedicamos a cada desafio, tornando mais nítido o crescimento que tivemos ao longo do tempo e transformando cada interlocutor e colega novo em um mundo de novos conhecimentos.
Como costuma acontecer, o texto já vinha sendo escrito na minha cabeça desde o começo da experiência de contratação pela +A Educação, empresa onde sou agora parte de uma equipe (como disse que gostaria de voltar a ser neste texto de 5 de abril passado). Só que ele acabou não chegando à tela em branco. Foi falta de tempo, sim, mas foi também muito mais coisa. Foi tanta coisa, que me senti vivendo no multiverso, com diferentes Cássias vivendo diferentes experiências em um grande dia da marmota, que infelizmente não era nem monótono, nem previsível.
Se por um lado todos os dias das últimas semanas pareceram o mesmo, por outro, cada minuto trazia uma novidade.
O começo da nova função da Cássia Profissional se deu quatro dias antes de uma cirurgia que estava marcada desde o começo do ano (e que vinha sendo adiada desde o nascimento da Lina). Assim, a segunda e a terceira semanas de trabalho, em que a curva de aprendizado já tende a ser uma perambeira (imagina em uma atividade nunca antes exercida nesta existência), foram vividas com bastante dor e medicações que me deixavam meio fora do ar e (perigo!) sem muito filtro. (A cirurgia era banal, sem gravidade, mas de recuperação bem dolorida e incômoda.)
Creio que para qualquer ser humano, já tínhamos uma boa dose de emoção, certo? Mas, porém, contudo, todavia, como suponho que o leitor, a esta altura, tenha feito as contas e percebido: essas tais semanas se deram justamente no maio de 2024, mês em que meu estado, o Rio Grande do Sul, e minha cidade, Porto Alegre, foram engolfados pela maior tragédia climática já vivida no nosso território. E a Cássia Cidadã derramou a tristeza e o sentimento de impotência neste outro texto, de 4 de maio. De lá para cá, cada gaúcho e tem vivido dias de conexões, doações e divulgações de e para inúmeros atos de voluntariado necessários, que nem todas as notícias e todos os textos do mundo são capazes de abordar. Infelizmente, estamos apenas no começo da reconstrução, que será longa.
E daí teve a Cássia Twitteira, que acabou estreando no mundo do cancelamento virtual com um tweet mal escrito (e maldosamente mal interpretado). Levei muitos xingões (imerecidos, pois não relacionado a qualquer dos meus inúmeros defeitos) e até ameaça de morte inbox (URGE que se implemente a Bolsa Terapia!) e ganhei defesa pública no próprio site do Elon feita por influencer milionário e vídeo de YouTuber queridão que explicou o óbvio que, felizmente, alguns heróis da resistência como ele ainda têm paciência para explicar. Eu não tenho mais. E confesso que fiquei mais perplexa do que chateada com o linchamento virtual. A dor física provocada pela cirurgia e a dor emocional causada pela tragédia gaúcha, combinadas com o estresse natural de um novo desafio profissional deixaram aquele surto de insanidade nas redes ocupar o tamanhico que lhe cabia no todo imenso da(s) minha(s) realidade(s).
Para finalizar o mês com uma nota de otimismo, a Cássia Tiete de Marido tive o prazer de ver ser lançado a que considero a melhor obra literária (até agora) do pai da minha filha. Saiu pela L&PM o livro O que não tem censura nem nunca terá – Chico Buarque e a repressão artística durante a ditadura militar, do Márcio Pinheiro, que me acompanhou, junto com a Lina, cada um desses mil dias de maio, em cada um dos diferentes universos, com cada uma das diferentes Cássias.
Agora as coisas parecem ter retomado o curso mais ou menos normal. E eu espero conseguir retomar meus textos por aqui. Porque novidades para contar é o que não falta.
